
Por vitor
Panorama dos brasileiros e o peso argentino nas quartas
Seis brasileiros saíram vivos da fase de grupos. Três sobraram nas quartas. O recorte é claro: equilíbrio alto e margem de erro mínima na Copa Libertadores 2025, que entra na reta decisiva com domínio argentino entre os oito melhores e um calendário que afunila até a final única de 29 de novembro, no Monumental de Lima.
O torneio começou com 32 clubes em oito grupos. Do Brasil, avançaram Palmeiras, São Paulo, Internacional, Botafogo, Flamengo e Fortaleza. Bahia foi o único a se despedir cedo, num grupo que não perdoou tropeços. Mesmo assim, 6 de 7 classificados confirmou a força recente do país, que conquistou as últimas cinco edições antes de 2025.
O sorteio das oitavas foi em 2 de junho, em Luque, no Paraguai, sede da Conmebol. Como manda o regulamento, líderes enfrentaram vice-líderes, com a vantagem de decidir em casa para quem terminou em primeiro. O caminho ficou traçado ali: sem chaveamento por país, cruzamentos pesados eram inevitáveis.
Nas oitavas, o impacto veio rápido. Flamengo eliminou o Internacional em duelo nacional, tirando da briga um bicampeão continental. O Botafogo caiu diante da LDU, do Equador, num confronto carregado de contexto de altitude e controle de jogo dos equatorianos. E o Fortaleza parou no Vélez Sarsfield, em derrota por 2 a 0 que expôs como o mata-mata pune quem não sustenta intensidade nos 180 minutos.
Resultado: apenas três brasileiros nas quartas — Flamengo, Palmeiras e São Paulo. Do outro lado, a Argentina empilhou vagas: River Plate, Racing, Vélez e Estudiantes. É a maior delegação nacional nesta fase, um recado direto sobre a competitividade do lado de lá, com projetos que mesclam base forte, técnicos com ideias claras e clubes copeiros, acostumados a jogos de meia posse e muita bola parada.
As quartas ficaram assim: São Paulo x LDU (Equador), River Plate x Palmeiras, Vélez Sarsfield x Racing e Estudiantes x Flamengo. Os jogos acontecem nas semanas de 17 e 24 de setembro. Semifinais em 22 e 29 de outubro. A decisão, jogo único, será em 29 de novembro, no Estadio Monumental, em Lima, no Peru.
O formato mantém o que o torcedor conhece: mata-mata em ida e volta até a final. A vantagem do primeiro lugar na fase de grupos vale ouro — jogar a segunda partida em casa muda a temperatura do confronto, gerencia o relógio e empurra emocionalmente o adversário para o erro. Em edição tão apertada, essa pequena margem vira trunfo.

Quartas de final: duelos, contexto e o que está em jogo
São Paulo x LDU carrega uma palavra que pesa: altitude. Quito está acima dos 2.800 metros, e isso mexe com fôlego, ritmo e tomada de decisão. A LDU conhece bem o atalho: ritmo cadenciado, campo grande na percepção de quem sofre com o ar rarefeito e muita exploração de cruzamentos e chutes de média distância. O São Paulo, tricampeão continental, precisa administrar o jogo fora e acelerar no Morumbi, onde o ambiente muda. Gestão de energia, banco participativo e bola parada defensiva afinada são chave.
Historicamente, a LDU sabe o caminho do título. Ganhou a Libertadores em 2008 e se acostumou a fases agudas em copas. O São Paulo tem estofo semelhante: três taças (1992, 1993 e 2005) e uma cultura de mata-mata que reaparece quando a defesa fica sólida. O limite do confronto deve estar no meio-campo: quem controla a primeira bola e a segunda sobra decide onde o jogo acontece.
River Plate x Palmeiras é jogo grande por definição. Duas camisas pesadas, dois clubes que investiram em estádio, base e metodologia. O River multiplica pressão alta e triangulações curtas, mas sabe baixar bloco quando precisa. O Palmeiras, tricampeão (1999, 2020, 2021), tem a frieza de quem se acostumou a administrar vantagem e rarear chances do rival. No detalhe, a disputa pode pender para quem proteger melhor a área nas bolas aéreas e for mais frio no primeiro tempo do jogo de volta.
Há memória recente que alimenta esse confronto. O Palmeiras já atravessou o River em fase aguda e aprendeu a sobreviver em ambientes hostis em Buenos Aires. O River, por sua vez, vira outra equipe no Monumental, com campo grande e pressão constante. A gestão de cartões e o calendário doméstico podem bater na escalação: rodar elenco no jogo anterior e evitar suspensões vira parte do plano.
Vélez Sarsfield x Racing é clássico argentino travestido de quartas. O Vélez chega encorpado, depois de despachar o Fortaleza por 2 a 0 e se apoiar numa linha de quatro segura, com laterais agressivos no tempo certo. O Racing, campeão continental em 1967, vive de uma torcida que empurra e de um meio-campo que alterna posse longa com ataques diretos. Jogo de energia alta, onde um gol cedo muda tudo.
Estudiantes x Flamengo tem cara de xadrez. Os pinchas conhecem como poucos a arte de competir: quatro Libertadores (1968, 1969, 1970 e 2009), bola parada letal e uma leitura fria de momento. O Flamengo, tricampeão (1981, 2019 e 2022), leva elenco profundo e poder de fogo. O recado tático aqui passa pelo controle do rebote defensivo e por como o Fla lida com cruzamentos ao segundo pau. Se o Rubro-Negro impõe velocidade entrelinhas, o Estudiantes tenta reduzir o jogo a duelos curtos e faltas táticas.
Os brasileiros que ficaram pelo caminho deixam lições. O Internacional, bicampeão (2006 e 2010), caiu em confronto nacional por detalhes de eficiência e concentração. O Botafogo, que tinha campo para crescer, esbarrou na LDU e no compasso do jogo em altitude, onde cada desperdício de ataque vira sofrimento atrás. O Fortaleza, projeto consistente e bem treinado, sentiu o peso da viagem e do ajuste fino contra o Vélez — em copas, uma noite ruim é suficiente para derrubar um bom plano.
O recorte argentino nas quartas chama atenção, mas não é acaso. River, Racing, Vélez e Estudiantes combinam treinadores com ideias claras, elencos com identidade e uma cultura de jogo que respeita o ritmo do mata-mata: posse útil, faltas cirúrgicas, tempo de bola aérea e leitura de cenário. É futebol de decisão, onde o brilho individual aparece, mas a estrutura segura o resultado.
Para os brasileiros, o roteiro passa por administrar viagens, calendário local e a janela de transferências. Setembro já é pós-mercado em muitas ligas, e saídas ou chegadas podem mexer no 11-base. Quem conseguir manter núcleo, preservar intensidade e evitar lesões em sequência larga na frente.
A final em Lima adiciona logística e história. O Estadio Monumental é imponente, com gramado que costuma favorecer quem estica passe e acelera pelos lados. A torcida brasileira deve comparecer em peso, como aconteceu em outras decisões recentes, mas times argentinos se sentem à vontade em campo neutro. Em jogo único, o emocional pesa quase tanto quanto o plano tático.
Vale lembrar o que está em disputa além da glória. A Libertadores garante premiações crescentes a cada fase e projeta o campeão para o cenário global, com vaga no Mundial de Clubes da FIFA. Em termos de orçamento, avançar uma etapa pode significar manter um titular no elenco por mais uma janela ou financiar infraestrutura que faz diferença por anos.
Detalhes que decidem este tipo de confronto não mudam: transição defensiva curta, proteção de área, bolas paradas bem ensaiadas e leitura de arbitragem. Quem entende cedo o limite do juiz e onde pode pressionar sem risco reduz o aleatório. E quem controla o relógio nos últimos 15 minutos, com ou sem bola, normalmente sai vivo.
No plano histórico, a vitrine desta fase impressiona. Flamengo (3), Palmeiras (3), São Paulo (3), River (4), Estudiantes (4), Vélez (1), Racing (1) e LDU (1) somam títulos e cascas suficientes para encarar ambientes hostis. Não há novato aqui. Isso aumenta a margem de imprevisibilidade e reduz a chance de goleadas — jogos tendem a ser de um gol, às vezes decididos numa cobrança de escanteio aos 80.
Os confrontos também recolocam no mapa discussões táticas atuais no continente: laterais por dentro ou abertos, pressão pós-perda curta, centroavante que participa do jogo, utilização de um meia mais vertical para atacar o espaço entre zagueiro e lateral, e o papel dos volantes na proteção de retaguarda. Quem acertar a última peça do quebra-cabeça no dia certo, mesmo sem espetáculo, leva a melhor.
Do ponto de vista físico, setembro costuma ser o mês em que os times ou atingem o pico de condicionamento ou pagam a conta de excesso de minutos. Rotação inteligente agora vale mais que em março. Colocar 15 a 18 jogadores em ritmo competitivo é tão importante quanto ter 11 titulares encaixados.
Também entra em jogo a cabeça. Copas se ganham com frieza para suportar o primeiro aperto, coragem para atacar quando o adversário baixa e maturidade para não transformar pressão em desespero. Bancos que entram sem queda brusca de desempenho viram diferencial nos finais de partida.
Agenda em mãos para o torcedor se organizar: quartas nas semanas de 17 e 24 de setembro; semifinais em 22 e 29 de outubro; final em 29 de novembro, em Lima. A Conmebol mantém a lógica de espaçar os jogos, o que permite preparação específica para cada ida e volta e reduz o risco de lesões por acúmulo.
O Brasil chega com três camisas pesadas e caminhos diferentes. O São Paulo precisa atravessar a altitude e empurrar o duelo para o Morumbi. O Palmeiras encara um River que se agiganta em casa e exige atenção total nos 180 minutos. O Flamengo encontra um Estudiantes que joga o adversário no desconforto e não tem pudor em baixar o bloco quando necessário.
Do lado argentino, quatro projetos sólidos que respiram copas. River, candidato natural sempre que chega. Racing, que busca recolocar o nome no mapa com proposta moderna. Vélez, que amadureceu no torneio. Estudiantes, copeiro, que transforma escanteio em decisão. Equilíbrio puro.
O recorte até aqui diz muito sobre a temporada: não há folga para quem relaxa 10 minutos. E, numa edição em que o fator casa pesa e as comissões técnicas estudam cada detalhe, a Libertadores volta a lembrar que, mais do que beleza, mata-mata cobra eficiência. Setembro promete noites longas.
Até Lima, cada passo será caro. E ninguém vai poder dizer que não foi avisado.